Repórteres são mandados às pressas, muitas vezes sem poder passar em casa para pegar seus casacões, enfrentam dezenas de quilômetros de estrada de chão até São José dos Ausentes, a cidade mais fria do Rio Grande do Sul, mas a neve só caiu na madrugada, e ninguém viu. De manhã, depois de uma noite mal-dormida em um hotelzinho precário, restaram apenas aquelas imagens de gotículas congeladas nas árvores, avidamente disputadas pelos cinegrafistas. Melhor sorte têm os jornalistas hospedados cidades onde há em hotéis confortáveis, com calefação e edredons quentinhos. Depois de cafés da manhã fartos, exercitam a sua criatividade entrevistando cariocas e paulistas deslumbrados com o frio, as compras e a paisagem. A neve? Bom, os meteorologistas garantem que ela cairá na próxima onda de frio, que como sempre vem da Argentina (os argentinos dizem que o frio vem da Antártida...).
Mesmo sem neve, os hotéis, pousadas e restaurantes lotam, e cobram caro. Turistas pagam qualquer preço, nem que vejam neve só em cartões postais antigos.
Os empresários e os secretários de turismo dos municípios estão na deles. Vendem o seu peixe. Os editores de tevês e jornais não têm nada a perder. Suas equipes sempre produzirão reportagens interessantes, na base do "já que não nevou, o jeito é tomar chocolate quente junto à lareira". E fazer de conta que estão nos Alpes ou nas Montanhas Rochosas.
Mas algum sociólogo, algum dia, ainda se dedicará a fazer uma tese de mestrado para descobrir a razão deste fenômeno que leva tanta gente que teria condições econômicas de pagar uma viagem até Bariloche, Las Leñas ou outro lugar onde realmente há neve (e se pode esquiar) a se deixar iludir por um lance de marketing repetido a cada ano. Será que ninguém, nunca, vai recorrer ao Procon, e exigir a neve prometida ou o dinheiro de volta????
A Cascata do Caracol, em Canela (foto de cima) e o Vale do Quilombo, em Gramado (foto de baixo), são tão bonitos que valem uma viagem até a serra gaúcha, no inverno ou no verão. Com ou sem neve.
4 comentários:
Excelente texto, Clovis. Veríssimo!
Oi, Clóvis! O Correcaminos está ótimo, sempre com textos interessantes e gostosos de ler. E as tuas fotos também estão caprichadas. Parabéns! Ótima sacada essa das promessas de neve na serra. Abraços, Marlova
Clovis,
por força de um trabalho estive três dias em Gramado, mês passado. Estava hospedado no Serrano, pomposo e tal, e decidi ir ao centro da cidade cortar o cabelo e comprar um par de chinelos. Quando retornei, sempre a pé, simplesmente me perdi ao tentar repetir o caminho percorrido. Achei que seria uma barbada encontrar o local - bastaria olhar as placas - mas cadê a sinalização? Fui direto na administração do hotel queixar-me. Como pode uma cidade com tanto fluxo turístico não ter sinalizações, placas, orientações, enfim, para facilitar o trajeto de quem não a conhece? Mas isso ocorre em plena Gramado, onde o centro parece de brinquedo e encontrar os acessos é tarefa de gincana. Isso é turismo planejado?
Abraço, irmão.
Jane e Marlova, amigas queridas, que bom que vocês gostaram do post. Às vezes eu me acho crítico demais, tenho que me controlar, mas esta mania da neve realmente é demais.
Beijos
Meu caro Emanuel,
concordo contigo: uma cidade turística, mais do que qualquer outra, deve ter placas indicativas de suas atrações e principais hotéis. Afora isso, gosto muito das cidades serranas, com seu ar europeu e a sua limpeza (talvez um pouco exagerados, chegando à beira do falso).
Abraços
Clovis
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