sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

NELSON, SEM LENÇO, SEM DOCUMENTO

Nelson é um uruguaio que, na década de 1980, resolveu descobrir as belezas do Litoral brasileiro. Depois de uma parada em Búzios, onde fez alguns bicos para sobreviver, subiu até o Arraial da Ajuda, na Bahia. Lá encontrou o paraíso que procurava. E, claro, se encantou por uma baiana, com quem passou a viver - e a ter filhos.
De vez em quando voltava ao Uruguai para rever parentes, e fazia uma parada em Porto Alegre para descansar - as viagens eram feitas de ônibus - e nos visitava.  Era amigo de um cunhado, o Guili, argentino que também acabou morando no Arraial.
(veja em http://clovisheberle.blogspot.com.br/2008/02/o-lobo-do-mar.html )
Foi uma dessas que Nelson bateu na porta de nossa casa. Ele, a mulher e quatro filhos pequenos, um deles de colo, com poucas semanas de vida.  Aproveitaram uma carona de um caminhão que vinha para o Sul e se mandaram, sem lenço e sem documento.
Era um fim de tarde chuvoso e frio, e não havia como negar pousada à família.
Contaram que estavam sem dinheiro e as crianças não tinham carteiras de identidade, indispensáveis para deixarem o país.  Precisavam da nossa ajuda.  Um pepino. Como hospedá-los numa casa pequena, nem que fosse por poucos dias?   
 Depois do jantar, Nelson abriu a mochila e tirou dela um tijolo de marijuana para fechar um baseado.  Conversamos, acomodamos a  turma do jeito que deu e fomos todos dormir.
 Na manhã do dia seguinte, pedi a ele que vendesse a "preciosidade". Assim,  conseguiria dinheiro para continuar a viagem e evitaria problemas com a polícia na fronteira. Minha mulher levou os seis para tirar fotos, e eu fui para o trabalho, de onde telefonei para  colegas e amigos pedindo socorro.
Milton Galdino era, na época, assessor de imprensa da Polícia Civil. Expliquei o caso e ele disse que os levasse ao seu gabinete, onde seriam identificados e em poucos dias receberiam os documentos. A assessora de imprensa da Secretaria do Trabalho e Ação Social se comoveu com a situação deles (e a minha...) e conseguiu vaga numa velha pensão do centro, situada em frente à Santa Casa de Misericórdia, para acomodá-los enquanto estivessem na cidade, com diárias pagas por um programa de acolhimento a migrantes do governo estadual.
A parte mais fácil foi vender a droga. Não faltaram compradores para fumo do nordeste, de primeira qualidade.
Uma semana depois, aliviados, levamos Nelson, a mulher e a filharada para a rodoviária. Chegaram sãos e salvos a Montevidéu. 
Final feliz para uma história surreal.


Outras histórias, reais e surreais, de argentinos, uruguaios, brasileiros, norte-americanos, bolivianos, peruanos, equatorianos e colombianos no blog Uma Banda Pelos Andes

http://umabandapelosandes.blogspot.com




quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

CENAS DO VERÃO/2014


No verão dos verões, praia cheia até anoitecer. 



Mergulhadores da Petrobras voltam para casa depois de um dia de trabalho no terminal marítimo de Tramandaí. A rotina desses trabalhadores do Terminal Soares Dutra (Tedut) está no post http://clovisheberle.blogspot.com.br/2011/11/onde-o-tedio-nao-tem-vez.html



Praia de rio pertinho do mar em Tramandaí



segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

DEPOIS DA MUVUCA, A BONANÇA


 A onda de calor que atingiu o sul do continente em dezembro de 2013, com temperaturas de  40 graus, fez com que chegar ao Litoral se tornasse uma obcessão para os gaúchos. 
Ah, sentir a brisa fresca do Nordestão, tomar um banho de mar.
Maravilha, nem que fosse preciso dormir no sofá ou  numa barraca no quintal da casa de um amigo ou parente.
E, de Torres ao Chuí - afora os milhares que se aventuraram a ir até as praias catarinenses, encarando horas de congestionamento na BR 101 debaixo do sol - os balneários gaúchos viraram uma muvuca. Foram duas semanas, da véspera do Natal até o início do Ano-Novo, de trânsito congestionado, muito barulho de foguetes e carros equipados com milhares  de decibéis fazendo bum-bum-bum. De enlouquecer.
 Nos bares, restaurantes, mercadinhos e supermercados, pessoas suadas e vorazes disputavam comes e bebes. 
No dia 31 já faltavam frutas, pão, carne e até cerveja.  
Exaustos, os comerciantes comemoravam o melhor final de ano de todos os tempos.  
Mas o novo ano chegou, a festa acabou. 
Bemvinda de volta, bonança.



sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

COMEMORAÇÕES SELVAGENS NO REVEILLON



Os finais de ano nas cidades do litoral norte do Rio Garnde do Sul são traumatizantes para os animais domésticos e silvestres. Com seus ouvidos bem mais sensíveis que os dos humanos, cães, gatos e pássaros são vítimas dos estrondos dos fogos de artifício. Ficam apavorados, buscam inutilmente um lugar para se esconder. Os donos acabam afetados: são obrigados a dopar seus bichinhos ou procurar lugares mais tranquilos para passar a noite do reveillon em vez de ficarem nas suas casas.
Esta estranha forma de demonstrar alegria começa no Natal e vai se intensificando à medida que o dia 31 se aproxima. A cada ano as bombas são mais potentes. Parece que a manifestação de felicidade destas pessoas depende do número de decibéis dos foguetes, semelhante a tiros de canhão. Insensíveis ao sofrimento dos animais e aos incômodos que causam aos vizinhos, não se contentam em apreciar os shows pirotécnicos que as prefeituras oferecem na hora da virada à beira-mar. E apenas curtir com a família e os amigos as últimas horas do ano, num clima de alegria e confraternização, como era antigamente.
Veranistas e moradores gastam em fogos - literalmente queimando dinheiro - quando poderiam (por que não?) - fazer doações a entidades que procuram tornar menos tristes os finais de ano dos carentes. Podem comprá-los em qualquer mercadinho de esquina - por baixo do poncho, porque por lei apenas estabelecimentos autorizados e fiscalizados pelos bombeiros poderiam vendê-los.
Já que apelar ao bom senso e o respeito ao próximo é cada vez mais inútil, talvez as prefeituras pudessem agir com mais rigor para impedir a comercialização dos fogos em estabelecimentos não autorizados.
Só tornando mais difícil a compra será possível conter estes bárbaros do século 21.



Para quero-queros e corujas, as "comemorações" dos humanos são uma tortura

(clique sobre as fotos para ampliá-las)