segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

PORTO ALEGRE NÃO MERECE ESTA RODOVIÁRIA




Projetada e construída pelo Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer), a Estação Rodoviária de Porto Alegre, inaugurada em 28 de junho de 1970, é prima-irmã do Muro da Mauá e do complexo viário da Conceição,  monstrengos de concreto  que mudaram - para pior - o Centro Histórico de Porto Alegre. 
Sua concepção, fruto da mentalidade da época, demonstra a preocupação com o gigantismo (era o tempo do Brasil Grande, do Grande Rio Grande), mas pouca preocupação com o conforto dos usuários: apesar de estar localizada numa cidade sujeita a longos períodos de frio, vento e chuva, ela é toda aberta, como se estivesse num país de clima tropical.  
Os engenheiros do Daer também não se preocuparam com espaços para embarque e desembarque dos passageiros e estacionamento gratuito para quem chega de carro.  
A prefeitura também não ajuda em nada: a sinalização das ruas e avenidas de acesso praticamente não existe, e desde que começou a obra de duplicação da avenida Voluntários da Pátria,  semi-paralisada há meses, é preciso dar voltas para achar o caminho da rodoviária.  
O entorno é feio, e  sair a pé é perigoso - na passarela de pedestres usada para atravessar a rua da Conceição, ladrões se misturam aos vendedores de bugigangas para roubar, especialmente, os recém-chegados do interior. 
À noite, a região é território de assaltantes, traficantes de drogas e viciados. Apesar de estar a 500 metros da Secretaria da Segurança, não há policiamento. 
Um cartão postal às avessas para quem chega pela primeira vez à "capital dos gaúchos".






Sua forma circular, além causar confusão nos passageiros, também dificulta a circulação dos ônibus, especialmente em dias de horários de maior movimento, pois os que estão manobrando para sair dos boxes impedem a passagem dos que estão nas pistas.





Os ônibus circulam pela parte interna da estação, com boxes de embarque e desembarque dos dois lados



Na pressa de embarcar, estas pessoas preferem se arriscar atravessando a pista dos ônibus a dar a volta até o box. Não há  divisórias, sinalização nem controle.



A espera do embarque tem pouco espaço e bancos de madeira insuficientes. A maioria espera em pé, mesmo. Em dias de chuva e vento, o desconforto é ainda maior.





Nestes 45 anos de concessão, sempre renovada sem licitação, a empresa que administra a rodoviária fez algumas melhorias, especialmente no setor de venda de passagens, mas as velhas lâmpadas fluorescentes e as caixinhas que indicam o número do box, de difícil visualização, continuam lá, para comprovar como ela é antiquada. 
Quem precisa fazer uma refeição só encontra lancherias com acomodações precárias e cardápios à base de salgadinhos, pastéis e a la minutas. A única churrascaria que funcionava na estação foi fechada, depois de varias interdições por falta de higiene. 
Os banheiros, mesmo os pagos, dão nojo. 
Porto Alegre merece uma rodoviária melhor. 
Muito melhor. 


sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

NÃO ESQUEÇAM DE MIM!




É só ver uma movimentação para viagem e o Lord pula para dentro da mochila. 
Será que ele tem medo de ser esquecido?

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

LOUCURA NÃO É MOTIVO DE ORGULHO



                                                   Edvard Munch, O Grito


A geração que foi jovem nos anos 60 e 70 - a minha - ficou marcada por filmes, reportagens e livros que retratavam os tratamentos cruéis a que eram submetidos os doentes mentais, confinados em manicômios.
 No filme italiano "Este Mundo é dos Loucos", dirigido por Phillippe de Broca, de 1966, a população de uma pequena cidade foge quando o exército alemão se aproxima, na primeira  Guerra Mundial, e os loucos do manicômio local aproveitam para sair e ocupar os prédios desertos. Mas a festa dura pouco: logo chegam as tropas de normais em guerra, e eles acabam voltando e fechando o portão que os separa do mundo exterior.
 Em "Um Estranho no Ninho", filme de 1975 dirigido por Milos Forman, um prisioneiro - o ator Jack Nicholson - se faz de maluco para sair da cadeia e não precisar trabalhar, e é mandado para um hospital psiquiátrico. Lá ele lidera uma rebelião dos internos contra as normas rígidas do lugar, mas acaba se dando mal. O drama é uma oportunidade para denunciar terapias desumanas como os choques elétricos e a lobotomia. 
Machado de Assis, no conto "O Alienista", usa toda sua ironia na história de um médico para quem todos os moradores da cidade - exceto ele, é claro - eram loucos e tinham que ser internados numa casa que ele mandara construir para isso. 
Em 1974, para fazer uma reportagem, o repórter Sérgio Caparelli foi internado no hospital Psiquiátrico São Pedro, em Porto Alegre, como se tivesse tido um surto psicótico, e escreveu uma chocante série de relatos no jornal Folha da Manhã sobre a rotina de violência e humilhações dos cinco mil internos. 
A mudança na forma de encarar os doentes mentais pelo poder público coincidiu com a redemocratização do país, no final dos anos 80. Associações de médicos, militantes de Organizações Não-Governamentais e políticos de partidos de esquerda se engajaram na luta anti-manicomial, com o objetivo de tirar os doentes mentais dos hospitais psiquiátricos. 
O problema é que não basta jogá-los na rua. É preciso criar alternativas de acompanhamento para que não fiquem à própria sorte, pois muitos não contam nem mesmo com famílias dispostas a cuidar deles. 
 Há alguns anos,  dezenas de internos que ainda moravam no hospital  São Pedro foram liberados. Alguns foram acolhidos por instituições de caridade, mas a maioria morreu de fome, de frio ou de doenças. Outros tantos ainda vagam pelas ruas, catando restos de comida, dormindo debaixo de marquises.  
Hoje em dia, são raros os casos de internação por longos períodos. Novos medicamentos, mais eficazes e com menores efeitos colaterais, foram incorporados ao tratamento de doentes mentais, permitindo que a maioria deles possa ter uma vida relativamente normal, desde que aceitem tomar diariamente os remédios prescritos pelos médicos. Mas ainda há muito, muito mesmo, a fazer, especialmente por aqueles que não contam com pais, parentes ou amigos com vontade ou  condições econômicas de pagar terapias com psiquiatras e, quando entram em surto, internações em clínicas. 
 Há preconceito, medo e muita rejeição aos "loucos".  Ter um irmão, um filho, um pai ou uma mãe esquizofrênico, bi-polar ou psicopata, sujeito a mudanças de humor, agressividade e todo tipo de mania, como esbanjar dinheiro ou não tomar banho, é uma causa de traumas.  Doentes sem cura, eles destroem as relações familiares. 
A rede de saúde pública mal dá conta dos portadores de doenças físicas,  que dirá para os doentes mentais.  Se um esquizofrênico tem uma faringite e é levado para um posto de saúde,  tem que se submeter ao mesmo ritual burocrático dos demais. E se, impaciente, reclamar da demora, corre o risco de acabar numa delegacia de Polícia por perturbar a ordem. Há os CAPS - Centros de Atendimento Psico-Social, mas eles estão longe de ter condições de acolher doentes e apoiar seus familiares. 
A inclusão da Parada do Orgulho Louco de Alegrete no calendário de eventos oficiais do Rio Grande do Sul  pode ser mais uma etapa na luta pela humanização do tratamento da doença mental, mas há um risco: de que proliferem por aí "paradas" caricatas,  protagonizadas por pessoas interessadas em sua promoção pessoal e/ou com objetivos políticos, mesmo que as intenções dos organizadores sejam as melhores.  
 Por isso, o governo do Estado poderia ir além: instituir um dia de defesa do doente mental, dedicado à discussão de medidas concretas para melhorar as suas condições de vida
Loucura não é motivo de orgulho. 
É um assunto muito sério para ser levado na brincadeira.