domingo, 10 de maio de 2020

DONA MARIA I NÃO ERA LOUCA














Alguns personagens da história ficaram marcados com adjetivos que, supostamente, definiram a sua personalidade ou  importância: "Pedro, o Grande", "Ivan, o Terrível", "Felipe, o Belo", "Isabel a Católica".
A Dona Maria I, rainha de Portugal de 1777 a 1816, quando faleceu, aos 81 anos, coube o carimbo pejorativo de "a Louca".
Nas aulas de história os professores não se aprofundam nas razões pelas quais ela ficou conhecida como vítima de transtornos mentais. 
A historiadora Mary del Priore decidiu esclarecer a questão. Foi a bibliotecas, pesquisou em coleções de jornais e em todas as fontes de informação disponíveis para descobrir quem era, de fato, Maria Francisca Isabel Josefa Antonia Gertrudes Rita Joana de Bragança e Bourbon. Conclusão: ela não era louca, de jeito nenhum.
D. Maria foi coroada aos 43 anos, depois da morte de seu pai, D. José I. Herdou um país traumatizado pelo terremoto que devastara Lisboa e pelos desmandos de seu pai, irresponsável e despótico, que deixou a administração ao Marquês de Pombal. Seu primeiro ato foi afastar Pombal e recuperar a dignidade do cargo que passou a ocupar, apoiada pelo marido,  o tio D.Pedro, irmão do pai, com quem teve uma relação de parceria e amor. 
Conquistou o respeito e a admiração dos seus súditos,  mas nove anos depois, teve uma perda que a abalou profundamente: a morte do marido, 17 anos depois do casamento. A responsabilidade de governar e de educar e proteger os seis filhos ficou unicamente sobre seus ombros, e a parte da nobreza que antes tramava nas sombras passou a hostilizá-la cada vez mais abertamente. Nos meses seguintes morreram  filhos e netos, e aquelas crises de melancolia, normais após essas perdas, se tornaram mais frequentes.
A medicina da época pouco podia fazer por ela - não havia nem diagnósticos nem remédios além das primitivas sangrias. Profundamente católica, confiava a seu confessor as suas angústias e crises de consciência, mas não  recebiia dele, e de uma abadessa amiga a quem era  muito ligada, nenhum alívio. Pelo contrário: ambos diziam que ela era punida por Deus  para se tornar uma  santa pelos sofrimentos.  Além disso, naquele tempo as doenças eram coisas do demônio, e assim ela convivia com o terror de, ao morrer, arder no fogo do inferno, eternidade afora.
O filho João acabou assumindo os encargos de governo, mas sempre assinando os decretos abaixo da assinatura de sua mãe, por quem tinha um grande afeto. A fuga da familia real para o Brasil, em 1808, fez bem para a rainha, que deixou em Portugal boa parte dos seus fantasmas. Ela viveu serenamente, no convento do Carmo,  no Rio de Janeiro, e só após a sua morte o filho assumiu o seu cargo, com o título de Dom João VI.
A morte de Maria foi pranteada por meses a fio No Brasil, em Portugal, nas colônias africanas, de Goa e de Macau. Seu corpo foi sepultado duas vezes: uma no Rio de Janeiro e outra na basíloica da Estrela, em Lisboa, cinco anos depois,  quando d. João VI voltou para Portugal. 
Se fosse examinada por um psiquiatra com o conhecimento que se tem hoje sobre a mente humana, d. Maria seria diagnosticada como vítima de depressão profunda. Com tratamento adequado, poderia levar uma vida normal. 
Louca ela nunca foi.



 

sábado, 9 de maio de 2020

CHUVA DE CAJU


Eu sempre achei que caju era uma amêndoa,  como o amendoim e a castanha do Pará. Só fui apresentado à fruta inteira quando tinha mais de 40 anos. Foi em Aracaju, a simpática e acolhedora capital de Sergipe. Fiquei parado na frente de uma banca de frutas, no centro da cidade, e pedi para a vendedora me explicar quais os seus nomes, uma a uma.
Desde então fiquei fã do suco de caju.




O cajueiro da pousada, no Arraial da Ajuda,  estava carregado. Volta e meia caía uma fruta no chão. Até que um dia o tempo fechou, ventou e choveu. Depois do temporal o sol voltou a brilhar, e o pátio da pousada ficou cheio. Chuva de água. chuva de caju.