domingo, 22 de maio de 2022

O CAMINHO DE TRANCOSO

 Andar pela praia até Trancoso era um programa indispensável para quem estava no Arraial da Ajuda nos anos 70/80. Os 13 quilômetros não eram cansativos -as belezas naturais, as praias quase intocadas, compensavam a canseira, aliviada também por banhos nos dois riachos do caminho. E éramos bem mais jovens...


É preciso sair de manhã, cedo, quando a maré está baixa. Depois que ela sobe fica mais difícil caminhar, e em alguns pontos a passagem pode ser perigosa.


Praia do Mucugê, a primeira parada para apreciar as piscinas naturais


Os recifes de corais, que com maré alta serão cobertos pelo mar


Paia da Pitinga, de uma beleza emocionante. Lá no fundo já dá para ver Trancoso.


Depois de seis quilômetros, uma pausa para se refrescar na água limpinha do riacho Pitinga



 
As falésias revelam seu colorido - lisérgico, se dizia na época

 

Parada para um banho de lama na Lagoa Azul


Uma ponta de pedras, e a vista do caminho já percorrido


Uma pequena praia isolada, cercada de pedras e falésias



Parada para beber alguma coisa no rio Taípe


A praia de Trancoso

 


Um olhar para trás

 


 Lá do alto dá para ver Porto Seguro



O quadrado de Trancoso. Hora de voltar, mas... de carona ou de busão.








sábado, 21 de maio de 2022

BRENO CALDAS SEGUNDO PAULO BROSSARD

 

A ideia era escrever um livro sobre de Breno Caldas. O projeto, liderado pela jornalista Núbia Silveira, acabou não se concretizando, mas várias entrevistas foram feitas por ela, por mim e os amigos João Borges de Souza e Celito de Grandi. Uma delas com o jurista, professor, ex-senador e ex-ministro  Paulo Brossard de Souza Pinto, amigo de Breno Caldas e colaborador do Correio do Povo. 

Encontrei um trecho dela num velho notebook em que foi degravada. Foi feita em dezembro de 2011,  com o apoio do dr. Leo Iolovitch, seu genro, com quem dividia o escritório de advocacia na rua Dario Pederneiras. 


Brossard - O que vocês querem saber de Breno Caldas? O que vocês não sabem?
 Nós - Queremos traçar um perfil deste homem que foi um dos mais importantes do Estado durante 50 anos e de repente naufragou -a empresa, a família, naufragou tudo. Vendeu tudo que tinha para pagar  suas dívidas. Se tornou um homem  praticamente pobre e terminou seus dias de cabeça em pé.  
Brossard - Vocês já conversaram com Paulo Pasqualini? Porque o Arlindo, pai dele, trabalhou com o Breno durante anos. O Breno diz que ninguém, de todos os que tinham trabalhado com ele, ninguém se comparava ao Arlindo Pasqualini. Ele podia sair para o outro lado do mundo, saía tranquilo porque o Pasqualini tomava conta.


P – Como é que o senhor conheceu Breno Caldas?
Brossard – Eu tive um tio, Dario Borba Brossard, que foi o fundador da página Rural – que antecedeu o Suplemento Rural. Era uma página que saía às sextas-feiras. Meu tio Dario foi quem iniciou isto e até ele morrer – depois ele foi para a FAO, passou 17, 18 anos morando em Londres, mas depois ele voltou e retomou. De modo que eu tive este acesso.
Realmente eu estabeleci contato com ele porque eu comecei a atividade política e depois a atividade profissional.
O Breno era engraçado. O Breno não acreditava em política, não acreditava em políticos. Até uma vez eu disse a ele “ o senhor não deveria dizer isso, porque afinal há políticos e políticos, e o senhor conheceu pelo menos dois, e conheceu bem, e que não eram isso que o senhor está dizendo, e eram bem diferentes um do outro. O Raul Pilla e o Alberto Pasqualini. Ele foi obrigado a reconhecer, digamos assim, a procedência.
Mas ele dizia isso. Era um traço dele. Eu compreendo isso, porque o jornal é uma coisa que se presta muito pra revelar muito tipo de pessoa. Que quer trazer para o jornal, sei lá, suas materinhas, botar o nome, o retratinho, e isso ele deve ter pegado muita gente, ficado vacinado. Especialmente – e isto é especulação minha, não juro – mas o fato é que ele tinha esta coisa.
Eu me recordo por exemplo uma vez – eu frequentava muito o Correio do Povo, conhecia, eu estava ainda na faculdade, não tinha uma atuação política maior, e eu me lembro que houve uma sessão lá na faculdade, eu não me lembro exatamente qual era - eu era presidente da Feupa, Federação Universitária de Porto Alegre, quando a Assembleia Constituinte de 46 terminou os trabalhos, foi promulgada a constituição, e os constituintes vieram para seus estados e vieram aqui para Porto Alegre dois constituintes que eram professores. Era o Raul Pilla e o Elói José da Rocha, um professor da faculdade de Medicina e outro da Faculdade de Direito.
E eu promovi uma homenagem dos universitários, a que a Universidade depois aderiu, o reitor naquela época era o Armando Câmara, então eu convidei para falar em nome dos professores o doutor Martim Gomes e em nome dos estudantes o João Leitão de Abreu, que estava terminando o curso. E foi uma sessão bonita.
Eu fui ao Correio do Povo depois da sessão, não sei para falar com o Adail (Borges Fortes da Silva) , o secretário, para sair uma notícia, e o Breno saiu do gabinete dele, e conversou, eu tava ali, o meu tio estava ali também, e se falou naquele negócio, como é que tinha sido. “E o discurso do Pilla, trouxe?” perguntou ele. O Pilla tinha trabalhado no Correio como jornalista e depois continuou como colaborador. “Não trouxe. O senhor não costuma publicar. Levei pro Diário.“

 E ele disse “ publico sim. Me pede pro Ernesto (o Ernesto Correa) que eu publico."
Mas era assim. Geralmente o Correio não publicava. Foi a primeira vez que eu falei com ele.
Foi em 46. Eu me formei em 47, eu estava na faculdade. A partir daí foram se avizinhando, e quando eu ia lá para conversar sobre alguma coisa, às vezes até para pedir – vou dar um exemplo: Falando uma vez sobre coisas do campo – ele gostava muito – ele disse que tinha feito um aramado com eucalipto. E que ele tinha feito os aramados há 20 anos, 30 anos, e estavam rebentando. Eu tinha comprado um aramado e fui lá para conversar especificamente sobre isso, totalmente fora do jornal. Então fui fazendo relações com ele.
Depois disso, uma vez que outra eu levava um artigo lá pro Adail e o Adail publicava, embora o primeiro artigo meu que foi publicado foi publicado no Diário (de Notícias), onde eu tinha amigos como Say Marques, grande figura, o Ernesto, também me dava com ele.
Depois houve aquele negócio com o Brizola. Quando era governador, o Brizola resolveu interferir, e ai de quem fizesse isso, aí é que tá. Havia dois jornalistas que eram brizolistas, e o Breno deixava muita autonomia pro pessoal. Mas até um certo ponto. E estes dois passaram do limite, ao juízo dele. Não me lembro agora quem foram. O Breno escreveu uma nota assinada. Ele era muito malicioso, escrevia muito bem. Sabia botar uma ironia muito discreta. E chamou os dois e disse:
“Eu sempre dei aos meus empregados a maior liberdade, mas vocês não pensem que eu não vejo o que está acontecendo. Eu queria dizer a vocês o seguinte: no dia que eu quiser vender uma coluna no jornal eu vou vender. O dia que eu quiser. Agora, não chegou este dia ainda. De modo que eu não permito que vocês utilizem o jornal para fazer aquilo que querem"

quarta-feira, 18 de maio de 2022

TEMPESTADE

 


 Um ciclone, com ventania e chuvas fortes, atingiu o litoral do RS entre 17 e 19 de maio. 
Teve ventos de até 100km/h,  e a falta de energia por quedas de postes e queima de transformadores chegou a 12 horas. 









sexta-feira, 13 de maio de 2022

PEGUEI UM ITA NO SUL

 



"Peguei um Ita no norte/e fui no Rio morar/adeus, meu pai, minha mãe, adeus Belém do Pará"
 Dorival Caymmi.


Década de 1930. O  jovem Leoncio Lobato Junior guardou, mês a mês, uma parte do salário de seu primeiro emprego, e nas férias pegou um Ita em Porto Alegre e foi realizar o desejo de conhecer o Rio de Janeiro. 

"Era uma beleza. A gente viajava com todo conforto, comendo e bebendo do bom e do melhor,  conversando com os outros passageiros e jogando cartas", contava o seu Leoncio, meu sogro, que se encantou pelo Rio e repetiu a viagem outras vezes. 

Os Ita (pedra, em tupi-guarani) eram navios a vapor da Companhia Nacional de Navegação Costeira - a Costeira - fundada no Rio em 1883 por imigrantes portugueses, os irmãos Lage. Numa época em que as rodovias e as ferrovias eram raras,  o Itaciqué, o Itaipú, o Itapé, o Itanagé, o Itanité, o Itaimbé, o Itapagé, o Itaberá, o Itagiba, o Itaguassu, o Itajubá, o Itapema, o Itapuca, o Itapuhy, o Itapura, o Itaquatiá, o Itaquera, o Itassucê, o Itatinga e o Itaúba levavam passageiros e cargas entre Manaus, Belém, São Luís, Fortaleza, Recife, Natal, Aracaju, Salvador, Ilhéus, Vitória, Rio de Janeiro, São Sebastião, Florianópolis, Rio Grande e Porto Alegre. 

A Costeira operou até 1965, quando a frota foi incorporada pelo Lloyd Brasileiro. Em 1970 os navios foram levados até um estaleiro do Rio, onde acabaram corroídos pela ferrugem.

Que tal se ainda fosse possível  ir até o cais de Porto Alegre e embarcar num Ita para Rio Grande, Florianópolis, Rio ou, quem sabe Manaus?

Bons tempos, aqueles.




domingo, 1 de maio de 2022

MARTINICA, 1902: INFERNO NO PARAÍSO

 


Até maio de 1902 Saint-Pierre era a mais próspera cidade da colônia francesa da Martinica, maior até que a capital, Fort-de-France. De seu porto saíam navios abarrotados de rum produzido de suas plantações de cana de açúcar, além de café e outros produtos. 

Nas últimas semanas de abril, porém, o vulcão do Mount Pelée, situado junto a ela, começou a dar sinais de atividade, após 51 anos.  Um fazendeiro subiu até o topo da montanha de 1.397 metros e observou, horrorizado, a lava cinzenta fervendo na cratera. Voltou a galope e despachou um aviso para o governador, pedindo que a cidade fosse evacuada pelo risco de uma erupção eminente. Recebeu de volta apenas um agradecimento cordial.

 Apelos ao prefeito também foram em vão. Mais preocupado com seu projeto político - haveria eleição dali a poucos dias e ele queria se manter no cargo - continuou com os preparativos para um  banquete para 400 convidados.  No dia 2 de maio o vulcão começou a expelir fumaça sulfurosa e fios de lava  deslizavam pela encosta da montanha. As cinzas cobriram a cidade, matando animais.  Fazendas próximas à montanha foram destruídas pela lava, que também alcançou e matou um  grupo de trabalhadores.

Em vez de cumprir o seu dever e determinar à população que deixasse a área, o prefeito divulgava mensagens tranquilizadoras. O jornal local publicou o parecer de um especialista em vulcões garantindo que a erupção ficaria por isso mesmo, e logo tudo voltaria ao normal. O tal especialista, anônimo, era uma invenção do diretor do jornal, mais interessado nas verbas do governo que na informação correta.

O governador, do mesmo partido do prefeito, chegou no dia 7 para conferir como estava a situação. Encontrou as ruas desertas, cobertas de uma grossa camada de cinzas. A população estava trancada em casa para poder respirar. Ele e a esposa decidiram dormir lá em vez de voltar à capital, localizada a 24 quilômetros de distância.

O fazendeiro que tentou soar o alarme saiu de sua casa com a família e se refugiou no alto de um morro próximo. De lá ele viu quando, na manhã do dia seguinte, uma enorme explosão seguida do jorro de lava saiu do Mount Pelée e em poucos minutos atingiu Saint-Pierre. No porto, navios carregados de rum pegaram fogo e o rum incandescente cobriu o mar, matando dezenas de pessoas que tentavam se salvar entrando na água. Apenas dois dos 29.935 moradores sobreviveram: um sapateiro que trabalhava no porão de sua casa e um prisioneiro que estava de castigo numa pequena cela do subsolo da cadeia.

Entre as vítimas estavam o governador e sua esposa, o prefeito e o dono do jornal. 

 do livro "O Dia do Fim do Mundo, de Gordon Thomas e Max Morgan Witts





Saint Pierre foi reconstruída, mas nunca mais se recuperou. Depois de 120 anos, sua população mal passa de quatro mil pessoas. 

Na foto da Wikipédia, a cidade com o Mount Pelée ao fundo.