quarta-feira, 28 de abril de 2010

RÁDIO DA UFRGS


SENTIMENTAL JOURNEY











Abril de 1971: aprovado numa seleção feita entre estudantes de jornalismo da UFRGS para um estágio de locutor, tive o privilégio de iniciar minha carreira na rádio da Universidade. Ganhava cerca de um salário mínimo, trabalhava quatro horas por dia, desempenhava as mesmas funções que os contratados mas não era submetido às pressões da competição e da cobrança das empresas privadas. Mais: convivia com profissionais de primeira como Celestino Valenzuela, Flávio Oliveira, Carlos Urbim, José Mitchell, Iara Bendatti, Clarice Aquistapace, Sérgio Stosch e Flávio Martins.
A experiência como locutor serviu para constatar que a vitrine não era o meu forte. O microfone me intimidava, mesmo sabendo que a emissora tinha poucos, embora qualificadíssimos, ouvintes. Me senti mais à vontade como repórter e redator do departamento de jornalismo.
O estágio de nove meses na Rádio da Universidade moldou o meu futuro profissional.

Abril de 2010: o táxi parou na frente do portão da Faculdade de Letras da Ufrgs, no
Campus Central, ao lado da Reitoria. Desci, pedi licença ao guarda para entrar e iniciei uma caminhada sentimental: à minha esquerda, o prédio onde, até o primeiro semestre de 1970, funcionou o curso de Jornalismo. À direita, o bar do Antônio, também chamado de bar da Filô, de tantas memórias. Era lá que, nas décadas de 60 e 70, os líderes do movimento estudantil se reuniam para articular protestos, passeatas e ... festas. Mais adiante, já na rua Sarmento Leite, o belo prédio da Rádio da Universidade, construído no início do século 20 e agora restaurado.
Subir novamente a escada da rádio depois de quatro décadas me emocionou muito. Acompanhado da querida amiga Nara Barbosa, colega da faculdade e companheira de uma viagem pelos Andes, rememorei aquela época em que estudava de manhã, trabalhava numa repartição pública à tarde e das oito até a meia noite anunciava as músicas clássicas . Disputava, também, de emocionantes campeonatos de botão, numa mesa instalada no estúdio A.
Convidado por Sérgio Dillenburg, produtor e apresentador de um programa dedicado a ex-alunos da Universidade, dei uma entrevista de meia hora. Tive a oportunidade de expressar o meu reconhecimento aos mestres que impulsionaram a minha carreira com seu exemplo, orientação e carinho, falei sobre a minha trajetória profissional, as viagens que fiz, a minha vida pessoal e muita coisa mais.
Depois, descendo as escadas ao som de uma sinfonia de Haydn, cheguei à conclusão de que aquele foi, além do primeiro, o melhor emprego que tive nestes 35 anos de tantas redações.
* A foto do prédio foi baixada do site da Rádio da Ufrgs.
A foto na escada é de Nara Barbosa.
* A rádio pode ser ouvida em AM, 1080 mhz, ou pela internet através do site http://www.ufrgs.br/radio/

segunda-feira, 19 de abril de 2010

ACREDITO NO AMOR




Não creio em duendes, em políticos, em pregadores que oferecem o paraíso em troca de dízimos. Sou incrédulo desde criança. Achava maçantes os rituais da igreja católica, especialmente as confissões. Estudioso e obediente, nunca brigava, não matava passarinhos, não dizia palavrões, e acabava tendo que inventar pecados para confessar e pedir perdão aos padres.
Logo que pude, abandonei a rotina religiosa.
Com o passar dos anos, perdi o temor daquele Deus severo, de barbas brancas, que me condenaria ao inferno caso, depois da minha morte, o balanço entre boas e más ações fosse desfavorável.
Restou, cada vez mais sólida, a crença no amor, na caridade, na compaixão. Me comovem os exemplos das pessoas, seja qual for a religião delas: aquelas que, anonimamente, cortam as unhas dos velhos nos asilos, assistem os doentes, as crianças abandonadas. Admiro os espíritas, que sem nada perguntar nem cobrar, dão abrigo, apoio espiritual e cura a qualquer irmão necessitado, e os padres, freiras e outros religiosos ou leigos dedicados a obras sociais.
Acredito que temos a obrigação de, a cada dia, nos tornarmos espiritualmente mais elevados, deixando para trás a mágoa, o ressentimento, o ódio, a vaidade. Para mim, é a única maneira de enfrentar com serenidade a partida definitiva desta vida, seja lá para onde for.

"Mesmo que eu fale em línguas, a dos homens e a dos anjos,
se me falta o amor, sou um metal que ressoa, um címbalo retumbante.

Mesmo que tenha o dom da profecia,
o saber de todos os mistérios e de todo o conhecimento,
mesmo que tenha a fé mais total,
a que transporta montanhas,
se me falta o amor, nada sou.

Mesmo que distribua todos os meus bens aos famintos,
mesmo que entregue o meu corpo às chamas,
se me falta o amor,
nada lucro com isso."

Primeira carta do apóstolo Paulo aos Coríntios, versículo 13.




domingo, 18 de abril de 2010

SUELLY ORSINI LOBATO


   

A funcionária do Cartório Eleitoral de Tramandaí ficou surpresa ao ver aquela senhora caminhando de andador se aproximar do guichê e anunciar que gostaria de transferir seu título eleitoral para votar nas eleições presidenciais de outubro de 2010. A menos de dois meses de completar 91 anos, estaria dispensada de participar da escolha dos dirigentes do país há décadas, mas não abria mão do direito - e do dever - de votar.
Outra surpresa: ao ser convidada pela funcionária para ser atendida no carro, para não ter que caminhar e ficar em pé, não aceitou. "Se os velhos ganham mordomias demais, acabam se tornando inúteis", disse.
Suelly Orsini Lobato, minha sogra, é assim. Cheia de energia, tem e expressa suas opiniões sobre qualquer tema, mesmo que isto resulte numa acalorada discussão.

Enquanto pode, não admitia abrir mão do que considera suas obrigações - tomar conta da casa, onde vivia com o filho mais velho, e administrar os imóveis que aluga para aumentar a renda da aposentadoria.
Só já não consegue cozinhar como antes. Ficaram na memória os bolinhos de bacalhau, os pastéis, os bifes de filé à milanesa, os camarões limpos um a um, os mocotós sem igual e as carnes assadas que perfumavam a cozinha do casarão da rua Faria Santos, no bairro Petrópolis, em Porto Alegre, onde morou até pouco depois da morte do marido, Leôncio Lobato Júnior, contador do Senai/RS. 

Cada almoço era um banquete - mesmo naqueles dias em que ela anunciava : "hoje não fiz nada..."
Vaidosa, pintava o cabelo e estava sempre bem vestida. Desde que foi morar no Imbé, em 2004,  tomava sol nos finais de tarde na varanda de sua casa, com vista para as montanhas, de banho tomado e perfumada, mesmo que não estivesse esperando ninguém. Fazia palavras cruzadas e, como toda avó, croché.

Gostava de estar bem informada: assinava e lia jornais e revistas, assistia telejornais e não perdia o programa de debates na tevê "Os Guerrilheiros da Notícia".
De ascendência italiana e portuguesa, Dona Suelly adora conversar. Por telefone, mantém contato constante com as seis filhas, a quem sempre está pronta a ajudar, dar conselhos, ouvir confidências. Sua generosidade se estende aos genros - todos para ela são filhos - aos netos e aos bisnetos.
As características mais marcantes de sua personalidade se manifestaram desde que ela era criança. Aos oito anos, estudando no segundo ano do colégio de freiras Sevigné, na rua Duque de Caxias, em Porto Alegre, um dia ela, sem consultar ninguém, caminhou até o Colégio Estadual Paula Soares, a um quilômetro de distância. Procurou a diretora e explicou que queria estudar ali pois estava muito pesado para a sua mãe viúva pagar um colégio particular. Contou como era difícil a vida para a família - ela, a mãe Adelina, o irmão mais moço Sady 
Orsini, que  se tornou um destacado advogado, e duas tias, Nica e Titina, que vieram juntos da cidade de Rio Grande, onde nasceram, após o falecimento de seu pai Luís Orsini.
Conseguiu a transferência, claro.
Com a mesma determinação que, aos 91 anos, foi até o cartório para transferir o título eleitoral de Porto Alegre para Tramandaí, e poder continuar votando.


Desde 2012,  depois de uma queda que a impediu de andar, dona Suelly passou a morar numa geriatria, o Ancionato Mariana, em Mariluz.  
Continuou lúcida, com boa saúde - era a única que não tomava remédio algum - e passava  as tardes vendo filmes, geralmente clássicos antigos, da sua videoteca, continuamente abastecida pelas filhas. 
Devota do Padre Reus desde criança, quando o conheceu, contava que o religioso havia predito que ela viveria por 100 anos. A profecia se realizou. Ela faleceu no dia 26 de setembro de 2019, aos 100 anos e três meses, tranquilamente, sem sentir dores,  de causas naturais.  


 Dona Suelly e eu na varanda de sua casa de veraneio, 
    no Imbé, em janeiro de 2010

        Foto de Rodrigo Lobato Duarte 


       O jovem casal Suelly Orsini e Leoncio Lobato Júnior em 1943

quarta-feira, 14 de abril de 2010

FLY, BUTTERFLY


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sábado, 10 de abril de 2010

VOCÊ AINDA COMPRA CD???


"Se você é daqueles que ainda compra cedês, confere aí este lançamento", disse o locutor da rádio FM com sua voz de pato, enquanto eu dirigia pela Goethe, quase chegando ao Parcão. Sim, respondi para mim mesmo, eu ainda compro CDs. Mesmo sendo cada vez mais caros, e raros. Mas aquele toque do cara da rádio ficou na minha memória. Me senti como naquela época em que os amigos distribuíam seus LPs, depois migrarem definitivamente para a tecnologia digital. Não demorou muito e eu também dava os meus discos e vitrolas.
Enquanto der, porém, vou continuar comprando cedês.


Mesmo sem ter mais toca-discos, ainda guardo algumas dezenas de LPs. Pelo conteúdo e pelas capas, verdadeiras obras de arte. A do Sticky Fingers foi criada por Andy Warhol.