Nelson é um uruguaio que, na década de 1980, resolveu descobrir as belezas do Litoral brasileiro. Depois de uma parada em Búzios, onde fez alguns bicos para sobreviver, subiu até o Arraial da Ajuda, na Bahia. Lá encontrou o paraíso que procurava. E, claro, se encantou por uma baiana, com quem passou a viver - e a ter filhos.
De vez em quando voltava ao Uruguai para rever parentes, e fazia uma parada em Porto Alegre para descansar - as viagens eram feitas de ônibus - e nos visitava. Era amigo de um cunhado, o Guili, argentino que também acabou morando no Arraial.
(veja em http://clovisheberle.blogspot.com.br/2008/02/o-lobo-do-mar.html )
Foi uma dessas que Nelson bateu na porta de nossa casa. Ele, a mulher e quatro filhos pequenos, um deles de colo, com poucas semanas de vida. Aproveitaram uma carona de um caminhão que vinha para o Sul e se mandaram, sem lenço e sem documento.
Era um fim de tarde chuvoso e frio, e não havia como negar pousada à família.
Contaram que estavam sem dinheiro e as crianças não tinham carteiras de identidade, indispensáveis para deixarem o país. Precisavam da nossa ajuda. Um pepino. Como hospedá-los numa casa pequena, nem que fosse por poucos dias?
Depois do jantar, Nelson abriu a mochila e tirou dela um tijolo de marijuana para fechar um baseado. Conversamos, acomodamos a turma do jeito que deu e fomos todos dormir.
Na manhã do dia seguinte, pedi a ele que vendesse a "preciosidade". Assim, conseguiria dinheiro para continuar a viagem e evitaria problemas com a polícia na fronteira. Minha mulher levou os seis para tirar fotos, e eu fui para o trabalho, de onde telefonei para colegas e amigos pedindo socorro.
Milton Galdino era, na época, assessor de imprensa da Polícia Civil. Expliquei o caso e ele disse que os levasse ao seu gabinete, onde seriam identificados e em poucos dias receberiam os documentos. A assessora de imprensa da Secretaria do Trabalho e Ação Social se comoveu com a situação deles (e a minha...) e conseguiu vaga numa velha pensão do centro, situada em frente à Santa Casa de Misericórdia, para acomodá-los enquanto estivessem na cidade, com diárias pagas por um programa de acolhimento a migrantes do governo estadual.
A parte mais fácil foi vender a droga. Não faltaram compradores para fumo do nordeste, de primeira qualidade.
Uma semana depois, aliviados, levamos Nelson, a mulher e a filharada para a rodoviária. Chegaram sãos e salvos a Montevidéu.
Final feliz para uma história surreal.
Outras histórias, reais e surreais, de argentinos, uruguaios, brasileiros, norte-americanos, bolivianos, peruanos, equatorianos e colombianos no blog Uma Banda Pelos Andes
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sexta-feira, 17 de janeiro de 2014
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Um comentário:
Grande amigo Clóvis! Belo texto, bela história! Saudades.
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