terça-feira, 2 de junho de 2009

JORNALISMO É CACHAÇA


Sonhadores, idealistas, vaidosos, os jornalistas costumam responder a quem questiona a sua teimosia em prosseguir numa profissão estressante, mal-remunerada, com um mercado de trabalho cada vez mais instável, que jornalismo é cachaça.
Ter o nome publicado no jornal, citado na rádio ou na tevê vale o sacrifício da vida pessoal, os fins de semana e feriados na redação ou na rua, as horas extras, as duplas jornadas para chegar a um salário aceitável. O jornalista se sente importante. Uma reportagem pode derrubar um secretário, um ministro, até um presidente da República. Muitos são reconhecidos na rua, cumprimentados. Os convites para coquetéis, almoços e jantares são tantos que é impossível comparecer à maioria deles.
Mas chega a difícil hora de mudar, por demissão, aposentadoria ou um emprego ou atividade que remunere melhor. São raros os casos de jornalistas que assumem com naturalidade a nova vida. Continuam lendo avidamente os jornais, ouvindo os noticiários de rádio e tevê, mesmo que o público de seus comentários se limite à esposa, os filhos, o dono do mercadinho da esquina. É o vício.
Foi o caso de um colega que, aposentado, continuava visitando na redação para tomar um café, comentar fatos, criticar coberturas que no tempo dele seriam melhores, muito melhores. Tinha sido repórter e chefe de reportagem, se orgulhava de ter acesso aos gabinetes de autoridades durante décadas.
Um dia, me ligou furioso. Caminhava pela rua da Praia quando viu uma viatura da polícia, gente correndo, assustada. Chegou até um grupo de pessoas e perguntou a um jovem fotógrafo do jornal onde trabalhara o que estava acontecendo. Ele não respondeu. Tentou puxar conversa, disse que também era jornalista, ex-colega. O rapaz, irritado, respondeu: "Não xaropeia, véio". E se afastou.
A grosseria serviu de lição para o veterano jornalista, que passou a se dedicar à pesquisa histórica, à poesia.
Nunca mais apareceu na redação.







Nenhum comentário: