terça-feira, 4 de agosto de 2020

CRESCER SEM DESTRUIR




ATHOS STERN

Engenheiro, 
professor aposentado da Escola de Engenharia da Ufrgs.
Presidente da Associação Comunitária de Imbé - Braço Morto.

 O  objetivo principal do crescimento é proporcionar aos habitantes uma melhoria na qualidade de vida e este é um processo que deve ser permanente. Planejamento é um processo, desta forma não deve ser confundido com o Plano. O Plano serve para guiar a ação por certo período e é resultado de um amplo processo de análises e acordos. Um Plano de Desenvolvimento Urbano deve prever o futuro e os possíveis impactos positivos e negativos, os quais, muitas vezes, favorecem ou contrariam os interesses econômicos de grupos, mas dificilmente atendem os anseios da população, e as prefeituras não preveem impactos negativos.
 O Estatuto da Cidade foi criado para nortear os Planos Diretores dos municípios que pretendem obter desenvolvimento e crescimento, sendo o objetivo principal ordenar o desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. As cidades são como são em virtude das normas e diretrizes estabelecidas nesses documentos, ou seja, tudo é moldado pelo Planejamento Urbano. Os Planos Diretores das prefeituras não atendem o Estatuto da Cidade por incapacidade técnica de sua equipe, preocupada com o adensamento populacional e aumento da arrecadação. Tanto o adensamento adequado quanto a criação de poli centralidades são princípios do desenvolvimento orientado ao transporte sustentável, uma estratégia de planejamento que articula o uso do solo à mobilidade urbana para criar cidades compactas, conectadas e coordenadas.
O Plano Diretor deve prever áreas de expansão, considerando a infraestrutura que será necessária para acompanhar esse crescimento, em especial a diretriz do próprio Estatuto da Cidade, que pressupõe a gestão democrática, com participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano. (A expansão pretendida pelas prefeituras é transformar áreas rurais e Áreas de Preservação Permanente em áreas urbanas).
 Conforme já apontado, cabe ao plano diretor criar as bases para uma cidade inclusiva, equilibrada, sustentável, que promova qualidade de vida a todos os seus cidadãos, reduzindo os riscos do crescimento desenfreado e distribuindo de forma justa os custos e benefícios da urbanização. Além disso, o plano diretor fornece transparência para a política de planejamento urbano, ao instituí-la em forma de lei. Diretrizes urbanas sempre existirão, a diferença é que com o plano diretor elas ficam explícitas, disponíveis ao cidadão para criticar, compreender e atuar sob “regras do jogo” bem definidas. Com ele, o cidadão pode decidir melhor ao escolher onde comprar uma casa para morar, o empresário pode escolher melhor onde investir em um novo negócio.  Por exemplo: uma família adquire um terreno e constrói sua residência. Se não houver um PD adequado, logo após é construído um prédio de 15 andares, ao seu lado, roubando-lhe tudo o que sonhou. Vejam a foto a seguir, que serviu de exemplo para a equipe da UFRGS mostrar as deficiências de um PD mal realizado:






O Plano Diretor deve prever a infraestrutura urbana composta de serviços e equipamentos urbanos como o saneamento básico, iluminação pública, melhoria dos serviços de transporte e outros. O saneamento básico no Brasil abarca uma gama ampla de serviços. Entram nesse escopo o Plano Integrado de Esgotamento Sanitário, Drenagem Urbana e Resíduo Sólido. A questão ambiental é muitas vezes esquecida e está relacionada à oferta de bons espaços públicos. Estabelecer zonas e corredores verdes na cidade é uma forma de criar uma rede de espaços públicos de temperatura mais amena e menores índices de poluição. Isso pode ser feito por meio de diretrizes específicas no PD, que versem sobre a quantidade e o dimensionamento de áreas verdes. (As prefeituras tendem a substituir gramados, vegetações nativas, etc. por áreas pavimentadas impermeáveis, canchas de skate, passeios pavimentados, canchas de esporte, etc.)
 As mudanças climáticas são uma realidade. Fenômenos extremos, como tempestades e furacões, devem se tornar cada vez mais frequentes e intensos. Tanto a prevenção quanto a capacidade e agilidade de resposta de uma cidade diante dessas ocorrências depende, antes de tudo, do saneamento básico que é um direito garantido por lei! (Como exemplo de ausência de prevenção, incapacidade e falta de soluções para os alagamentos que tem ocorrido nos municípios):



A drenagem da água da chuva para evitar enchentes é muito importante no saneamento básico, porque enchente não é culpa da chuva, é um problema da falta de planejamento e crescimento desordenado. A cidade precisa melhorar a infraestrutura de drenagem nas vias públicas. O grande problema é que em geral, os municípios não possuem um projeto de drenagem pluvial, decorrente da falta de recursos humanos preparados para realizar estes planos e para tomar decisões de médio e longo prazo. Se o Ministério Público for procurado, pois atua na defesa da ordem urbanística, do uso e ocupação do solo urbano, tendo por objetivo assegurar planejamento, organização e qualidade de vida sustentável das cidades, certamente nada poderia fazer, devido à ausência de técnicos competentes para solucionar o problema. Então cabe as perguntas: como solucionar o problema? O que pode e deve ser feito? Quem poderia ajudar? Quando fazer, agora, médio prazo ou longo prazo?

Além disso, a expansão significa mais congestionamentos, poluição e viagens mais longas. O ar poluído, impulsionado principalmente pelo uso de carros particulares e caminhões, gera imensos custos sociais, econômicos e impactos na saúde. Já estamos vendo algumas das áreas urbanas que mais crescem em zonas costeiras de baixa altitude, planícies de inundação, em locais de elevada biodiversidade e áreas com problemas de água. O desenvolvimento desenfreado desses ecossistemas sensíveis pode forçar ainda mais os recursos naturais e levar a inundações desastrosas. A Prefeitura Municipal de Xangri-lá contratou diagnóstico da UFRGS, que através de equipe técnica, levantou os principais problemas Ambientais e Urbanísticos do município. Entre outros, abordaram a Contaminação do Solo e Recursos Hídricos (mar, rios e arroios). Observa-se que muitos especialistas não dão a importância que exige os deságues que ocorrem em todo o nosso litoral, pois como as fotos mostram, estes deságues podem interditar a praia inteira.  Considerar como insignificantes estes córregos poluídos, face as dimensões do oceano,  é impróprio.



A maior dificuldade para implementação do Planejamento Integrado, decorre da limitada capacidade institucional dos municípios para enfrentar problemas tão complexos e interdisciplinares. A prefeitura de Xangri-lá diante deste fato, recorreu à UFRGS. Atitude elogiável! Somente como referência ao diagnóstico da UFRGS, este aborda o grande problema que ocorre nos municípios do litoral, com densificação elevada: o sombreamento!


A situação do município de Imbé pretendida pela prefeitura é infinitamente pior. Só para lembrar:




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Um modelo de desenvolvimento urbano excludente e predatório continuam presentes em várias dimensões do processo de urbanização no litoral norte do Rio Grande do Sul. Esta observação busca discutir alguns dos obstáculos que têm incidido sobre a capacidade da rede urbana brasileira de responder ao desafio de ampliar o direito à moradia e à cidade para o conjunto de moradores. O crescimento da economia, têm provocado um dos maiores ciclos de crescimento do setor imobiliário nas cidades litorâneas do Rio Grande do Sul e do Brasil, criando desafios que não são poucos, pois não se trata apenas expandir. A infraestrutura praticamente inexistente em algumas cidades, não poderão absorver este crescimento, pois a base financeira, política e de gestão, sobre a qual foi construído um processo de urbanização, consolidou um modelo.
 Os Planos Diretores (PDs) são instrumento básico da política de desenvolvimento de uma cidade. É a legislação que define as diretrizes para a gestão territorial e a expansão dos municípios. Planejamento urbano, designa o ato de planejar, organizar ações e tarefas com a utilização de métodos adequados para atingir determinado objetivo – nesse caso, o desenvolvimento sustentável das cidades. Regidos pelo Estatuto da Cidade, os Planos Diretores norteiam o desenvolvimento e o crescimento dos municípios – têm o objetivo de ordenar o desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. O Estatuto das Cidades indica o caminho para reverter o processo inadequado de ocupação do espaço urbano ao incorporar diretrizes para o uso e ocupação do solo, para a preservação e ocupação de áreas verdes, de forma a reduzir a impermeabilização das cidades, bem como ações de intervenção preventiva e de realocação de população das áreas de risco, regularização fundiária e medidas estruturais. Todos os municípios devem formular as suas políticas públicas visando à universalização, sendo os Planos de Saneamento Básico (PMSB) o instrumento de definição de estratégias e diretrizes para os municípios brasileiros. Os municípios tinham até dezembro de 2019 para confeccionar e implementar os planos sem risco de perder verba federal em obras no setor. “Diagnóstico da situação dos Planos Municipais de Saneamento Básico e da regularização dos serviços nas 100 maiores cidades brasileiras “, das 5.570 cidades brasileiras, apenas 1.693 (30%) realizaram seus Planos Municipais; 38% das cidades declararam que estão com os planos em andamento. Grande parte dos municípios do litoral norte não possuem estrutura e nem técnicos habilitados a realizarem o Plano Municipal de Saneamento Básico e, de que forma, pela falta de saneamento básico, lixo jogado e o uso intenso de agrotóxicos para a produção de alimentos, iremos impedir os resultados negativos às águas do nosso rio Tramandaí, em constante degradação?


2 comentários:

Marivaldo Cascaes- Imbé -RS disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Marivaldo Cascaes- Imbé -RS disse...

O assunto mereceu toda a minha atenção! Realmente o texto do Eng. Stern, e muito amplo e rico em informações sobre o PMSB.e mostra com certeza que muitos municípios do nosso litoral Norte, não possuem habilidade para a elaboração do PDU . Marivaldo Cascaes - Imbé RS