Uma rua, a dos Andradas, separa os prédios que simbolizaram duas eras no jornalismo gaúcho. Ambos ocupavam uma quadra inteira da rua Caldas Júnior, no centro de Porto Alegre. O prédio da foto de cima era do jornal A Federação. Fundado em 1884 e sustentado economicamente pelo Partido Republicano, chegou a ter, na década de 1910, uma tiragem de incríveis 10 mil exemplares. A redação e as rotativas foram transferidas para a este belo prédio de estilo em 1922, quando foi inaugurado.
A Federação tinha excelentes redatores, os mais modernos equipamentos e era muito bem feito para os padrões da época. Mas, por ser partidário, não tinha credibilidade. Era sempre o porta-voz do partido que o sustentava, assim como dezenas de outros periódicos, criados e fechados ao sabor dos movimentos políticos. Encerrou suas atividades em 1937, quando a ditadura Vargas extinguiu todos os partidos políticos da época.
O Correio do Povo, fundado em 1895 por Francisco Antonio Vieira Caldas Júnior, anunciava na capa da primeira edição os seus princípios básicos: estava a serviço dos leitores e de toda a população, sem defender partidos políticos ou governos. Por cumprir o que prometera, o jornal cresceu rapidamente e se tornou, na década de 1920, o mais importante diário do Rio Grande do Sul, posto que ocupou até a crise econômica que o abateu na década de 1980.
A isenção, a busca da verdade dos fatos, a independência econômica e editorial se tornaram, no século XX, compromissos de todo o veículo de comunicação que se preze.
E os jornalistas?
Até a década de 1960, quando foram criados os primeiros cursos de jornalismo e intensificada a campanha para a regulamentação da profissão, era normal o jornalista ter outra fonte de renda, quase sempre a principal. O jornalismo era a "cachaça", onde ele extravasava seus dotes literários, vivia as aventuras da reportagem.
Com a exigência do diploma para o exercício da profissão, o ensino de jornalismo em universidades e a preocupação das empresas em contratar profissionais de qualidade, esta situação mudou. A independência intelectual, a ética e a dedicação exclusiva ao trabalho passaram a ser exigências básicas para exercer a profissão.
Nada contra um jornalista trabalhar numa assessoria de imprensa de uma empresa, de um governo, de um partido. Mas isto não é jornalismo.
Nas últimas duas décadas, no entanto, a crise política e econômica que atinge o Brasil e o crescimento da mídia digital têm afetado de forma cruel as empresas de comunicação. Jornalistas têm sido despejados às centenas das redações. Sem emprego, partem para outras atividades, se sujeitam a salários bem menores e muitas vezes mudam de profissão para sobreviver. O Judiciário, ao derrubar a exigência do curso de jornalismo para exercer a profissão, contribuiu para piorar a situação.
O jornalismo militante, em que profissionais e empresas escancaram suas preferências políticas e vêem os fatos sob o viés de suas ideologias, é cada vez mais praticado. Com poucos repórteres qualificados, depois de tantos "passaralhos" para a contenção de custos, as empresas de comunicação se tornaram vítimas das fake news, que proliferam nas mídias sociais como ervas daninhas em solo empobrecido.
Estaremos voltando para o o jornalismo que se fazia no século XIX?
2 comentários:
O lindo prédio do antigo jornal A Federação, de estilo eclético (como diz o Wiki), abriga hoje o Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa, fundado em 1973.
Ele fez reviver na memória fato que gostaria de citar, a título de complementação ao teu excelente texto. O prédio teve um curto protagonismo como Museu, na acepção mais completa do termo, durante a gestão do Lauro Schirmer. Foi com ele que o Instituto Goethe trouxe a maravilhosa exposição do Vitra Design Museum, Alemanha, com miniaturas de cadeiras! As miniaturas de designers famosos eram apresentadas em blocos de vidro, tipo vitrines. Um sucesso na época.
Complemento importante e necessário, Herta. Obrigado, beijos
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