"La Negra", com o compositor, pianista e maestro Ariel Ramírez, na gravação da Cantata Sudamericana, em 1972
Mercedes Sosa, junto com Atahualpa Yupanki, é a face mais conhecida da riquíssima música folclórica argentina, que floresce na paisagem árida da pré-cordilheira dos Andes.
Graças a ela, nós brasileiros pudemos tomar contato com algumas preciosidades do folclore argentino, chileno, boliviano, peruano. Com vigor, talento e coragem, Mercedes desbravou a selva da ignorância e do preconceito até hoje existentes no Brasil em relação à América hispânica. Com sua voz forte, ao som do inseparável bombo legüero, pregava com convicção religiosa um continente com "fronteras de flores y fuziles de mentira".
O primeiro contato com a zamba, a baguala, a chacarera e outros ritmos da Argentina criolla, de raízes indígenas, foi uma porrada na minha cultura musical, até então limitada à MPB, ao rock e aos clássicos.
Em dezembro de 1971, aos 21 anos, parti para uma viagem pela América do Sul, junto com alguns colegas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Nunca havia atravessado o rio Uruguai.
A primeira parada foi em Salta, cidade do norte argentino, junto à Cordilheira. Nos hospedamos na casa de Manuel Castilla, um dos mais importantes poetas e compositores do país. Era o período das festas de fim de ano, e passávamos os dias e as noites bebendo vinho, mascando folhas de coca e ouvindo os grupos musicais da cidade. Um banho de ritmos, harmonias e instrumentos musicais criados pelos incas, como a quena e o charango.
Desde então a música folclórica argentina ganhou um lugar de honra na minha alma. Tive a felicidade de ouvir Mercedes Sosa em shows inesquecíveis em Porto Alegre e no Memorial da América Latina, em São Paulo, assim como Atauhalpa Yupanki e outros mestres. Uma das maiores emoções que já tive foi assistir a Misa Criolla interpretada por seu compositor, Ariel Ramírez, com um coral de crianças vindas da Argentina. Um dos meus discos prediletos é Cantata Sudamericana, outra obra de Ramírez em parceria com Felix Luna, na voz de Mercedes Sosa.
Buenos Aires é linda, cosmopolita, quase européia. Impossível não gostar da cidade. Mas se me perguntarem para que região da Argentina eu mais gostaria de ir, respondo: Santiago del Estero, Tucumán, Salta, Jujuy. Lá sim bate forte, ao ritmo do bombo legüero, o coração argentino.
"Si la muerte me lleva
no será para siempre
yo revivo en mis coplas
para ustedes, para ustedes"
Da música Alcen La Bandera, de Ariel Ramirez e Félix Luna
Álbum Cantata Sudamericana
domingo, 4 de outubro de 2009
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8 comentários:
Otra liberación, otra liberación !!!
Realmente foi divisor de águas o canto da Mercedes. Para mim, que curtia o sol da fronteira, então...bateu forte também. Entrevistei ela em Floripa, lá pelos fins de 90, e matei todas as minhas curiosidades, tipo gosta de Jaime Roos? "En Argentina amamos a jaime Roos", me respondeu Mercedes. Charly já era meu ídolo, e essa ligação sempre tive em comum com Mercedes, amiga do ídolo desde sempre. Lembra daquele vinil duplo que lançaram no Brasil, com várias músicas da carreira ( Si se calla el cantor, Balderrama, Alfonsina y el Mar, etc...). Curtíamos adoidado em Santana. Na época de pré internet, Mercedes me recloamavba da falta de atenção que as gravadoras tinham dado para ela no Brasil, e queria recuperer seu público. Depois do exuberante show, dei de presente para ela uma fita cassete. Cartola e João Nogueira. Ela comentou que tinha sido apresentada a música de Cartola por Chico Buarque. Feliz, disse que iria escutar no walkman a fita, de regresso a Buenos Aires. Saliste de gira, negra querida!
Marlon, meu caro,
Os meus amigos que tiveram o privilégio de estar com Mercedes Sosa ficaram impressionados com a sua simplicidade, a sua ternura, a sua curiosidade pelos novos sons, ritmos. É isso: quem é gênio não precisa botar banca.
Fico contente por teres tido esta oportunidade rara.
Reproduzo abaixo duas mensagens mandadas por amigos.
1 - Paulo de Tarso Ricordi, jornalista:
Pude assistir a um único show de Mercedes Soza. No Gigantinho, em Porto Alegre, final dos anos 70, antes de ela partir da Argentina para o exílio europeu.
A Negra estava cantando maravilhosamente (Duerme negrito era uma das mais pedidas, à época) e nós a ouvíamos apaixonados. Nisso, paramilitares estouraram algumas bombas de gás lacrimogêneo atrás da platéia, perto de onde eu estava. Houve um princípio de pânico, pessoas começando a correr, a tentar sair, a se atropelar.
Foi quando Mercedes percebeu o que estava havendo e disse, com sua voz poderosa:
- Acalmem, acalmem. Abaixem-se o mais que possam e respirem através de algum pano. E acendam as luzes “Eles” só sabem agir no escuro. Têm medo da luz”.
E assim foi. Gigantinho totalmente lotado, as pessoas permaneceram em seus lugares, já sem pânico, confiantes na orientação da Negra, que reiniciou a cantar. O gás subiu e se dispersou. E o show seguiu tranqüilo até o final. Seguro. Emocionante.
2- Lourival Gonçalves, médico, residente em Uruguaiana, companheiro de uma viagem pela sudamerica nos anos 70:
"Tenho recordado de uns momentos que a Califórnia da Canção me proporcionou. Em 1987, na direção do evento, quis trazer a Mercedes a Uruguaiana. Recorri ao amigo Luis Carlos Borges, que me levou a Buenos Aires, direto ao apartamento dela, na 9 de julho. Saindo do elevador, pra sentir o clima, um retrato a óleo muito conhecido, capa de um disco, acho que "Mujeres Argentinas". Lá dentro, nos esperava Mercedes Sosa, acompanhada do filho. Na conversa, tive oportunidade de falar sobre nossa experiência em Salta, com Manuel J. Castilla, Gustavo Leguizamón, os Salteños. Enquanto ouvíamos uma cantora mexicana, Amparo Ochoa, cantando um tema sobre o dilema da mulher, entre a família e a carreira artística, que a levava as lágrimas - porque lhe falava diretamente- também nos oferecia um bom vinho argentino. Alguns dias depois, em Uruguaiana, depois de seu espetáculo, apresentei-a ao Elomar - que também era uma das atrações - e ao Sérgio Rojas, que viria a ser seu amigo e convidado para vários outros shows seus. Nessas duas oportunidades, surpreendeu-me pela atitude natural e extremamente receptiva. Muitos anos depois a reencontrei em Cosquín, aí então cercada por um enorme aparato de cuidados e reverência da imprensa argentina. Mas era a mesma Mercedes Sosa, célebre sem deixar de ser uma simples e frágil mulher, quem sabe aí não estava o seu segredo, seu carisma...
Muita saudade de la Negra Sosa, como dizem seus compatriotas."
Aí estão três depoimentos valiosos que esculpem o perfil de Mercedes Sosa.
Abraços
Clovis
Mercedes!!!!!!!!!!!!
Mujer,amiga,madraza,genia,luchadora,transgresora... que supo sobrevivir a la historia, a las fronteras y al pasar del tiempo..
Personas .. como ella me hacen sentir orgullosa de ser Argentina!!!
Hoy .. en Tucumán sus cenizas se esparcen, para no solo quedar en el recuerdo de los muchos que la siguen , sino para unirse a la tierra, a su tierra , a la que siempre quería volver....Entonces aferrada a ella , su alma, ya en paz, en el cielo , podrá ser recibida por los aplausos eternos que se oyen desde todos los rincones del mundo.
Ella no nos pertenece ..... Es más que Argentina!!
La Negra es de todos!
Ella, por medio de sus canciones logró que personas de paises diferentes, con historias diferentes se acerquen y se conozcan.
Este compartir comentarios , nos vincula, tornándonos , aunque no más sea en un instante "amigos" por que así los siento....
En fín ¿qué es la amistad? ¿qué es el amor?sino compartir sentimientos, gustos, conceptos, opiniones........
Brindemos .. con un buen vino argentino.. escuchando un Vestido y un.....en su nombre, en nombre de la vida.. en nombre del amor.. en nombre de la amistad!!!!
Gracias por sus comentarios, amigos y amigas. Les invito a leer mi blog
http://clovis.heberle.blog.uol.com.br
un viaje de ocho meses por América del Sur en 1971/72.
Abrazos y besos
Clovis
Tu viaje me resultó fascinante.. una loca aventura que dan ganas de vivirla.
recorrer esos lugares como turista es maravilloso.. pero hacerlos a esa edad y de la manera que Ustedes lo hicieron es algo inolvidable.. y eso es lo que transmitís en los relatos!
Gracias, María,
muy amable!
Sudamericana, por supuesto???
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