Há quem garanta que nenhum ser humano normal consegue pensar antes das dez da manhã, muito menos ter vontade de achar graça em alguma coisa.
Por um acaso do destino - ou por falta de outra opção profissional-, sempre tive que madrugar. Na rádio Continental (a dos anos 70), na rádio Gaúcha, na RBSTV, na Folha da
Tarde, no Correio do Povo, meu batente começava cedo. E os neurônios tinham que estar conectados.
Na Zero Hora, durante anos, coordenei a "reunião das nove", na qual organizávamos a produção do dia. E o maior desafio não era a pobreza da pauta das editorias, mas as noites mal dormidas dos seus representantes. Jornalista que se preze gosta de ler, conversar e beber até a madrugada.
O Ivo Stigger é uma rara exceção. Lá nos tempos do Correio do Povo. em 1979, eu chegava cedinho para fazer a pauta. Quando o Ivo chegava, o silêncio da redação era quebrado pelas gargalhadas. Ele e o Gandolfo, da coluna de fúnebres, sempre tinham histórias hilariantes para contar. E levantar o astral dos colegas que chegavam.
Nos anos 80 trabalhamos juntos na editoria de Geral de Zero Hora, onde ele foi repórter e editor e eu pauteiro - aquele cara que ganha para bolar bons assuntos para os repórteres transformar em reportagens.
Num dos churrascos de fim de ano da editoria capitaneada pela Núbia Silveira, depois dos comes e bebes, o Ivo Stigger pediu a palavra. Tirou do bolso um maço de laudas (aquelas folhas de papel onde, antes da era digital, se redigiam as reportagens) e, no tom mais sério que conseguiu, passou a descrever as agruras de um dia de repórter.
Chamado pelo chefe de reportagem (na época eram dois, o Adilson Porto Alegre e o Hélvio Schneider), o infeliz recebia as pautas do dia: entrevistar o secretário da Saúde (que está te esperando, sai correndo), depois fechar a matéria com o diretor do hospital. "E já que vais no hospital pergunta como estão as obras de restauração (dá outra matéria) e no caminho confere como está aquele buraco da João Pessoa aberto há meio ano. Ah, e como estamos no início da primavera pede uma boa foto para o retratista e faz uma materinha ambiental que pode render capa."
E quando o repórter volta, esbaforido, louco por um lanche, a ordem: "senta aí e escreve as matérias, que não podemos atrasar o baixamento."
Gargalhadas gerais, inclusive das vítimas da gozação.
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