domingo, 21 de novembro de 2010

O ENCANTADOR DE MACACOS


Malucos de todos os tipos são fascinados por rádio, tevê e jornal. Fazem qualquer coisa para aparecer.
Os que sabem escrever mandam cartas, e depois que a primeira é publicada passam a entupir as seções de atendimento ao leitor. Há os que querem conhecer os seus ídolos, e às vezes conseguem passar da portaria para importunar os comentaristas e repórteres mais conhecidos.
Os mais perigosos, porém, são aqueles que procuram as redações para darem idéias de grandes reportagens.
Editores com alguma experiência na profissão distinguem em alguns minutos de conversa que estão lidando com uma pessoa desequilibrada, em busca de notoriedade ou apenas um pouco de atenção. Se a avaliação psicológica falha, uma checagem básica desmonta qualquer tentativa de enganação.
Mesmo assim, de vez em quando algum deles consegue transformar em matérias jornalísticas invencionices como estátuas que vertem lágrimas (ou mel), supostos milagres (e milagreiros) e outras coisas que seriam extraordinárias, com repercussão mundial, se fossem verdadeiras.
Numa manhã de primavera um desses loucos mansos chegou na redação da RBSTV, onde trabalhei nos anos 80, com um assunto sensacional: ele tinha o dom de encantar os animais e pássaros, que obedeciam às suas ordens, transmitidas telepaticamente. Propôs que a tevê gravasse uma apresentação, para que o mundo soubesse de seus poderes mágicos.
Colocando em prática o princípio de que "louco não se contraria, corre junto", combinei com ele que a reportagem seria gravada na manhã do dia seguinte, no minizôo do Parque da Redenção. Os personagens seriam os macacos, as araras e outros bichos enjaulados no local, que ao comando dele fariam acrobacias, dançariam e cantariam.

Não cumpri a minha parte no trato, mesmo correndo o risco de ter perdido a maior reportagem da minha vida.





sábado, 13 de novembro de 2010

AS CASAS DA SANTA CASA


Criada por Aviso Real de Dom João VI, rei de Portugal, em 19 de outubro de 1803, confirmado em 1822 por Dom Pedro I, a Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre começou a receber doentes em 1º de janeiro de 1826. Em 1899 o rendimento de 57 casas alugadas na cidade era a principal fonte de recursos e garantia de atendimento gratuito à população carente da capital da Província.
Em 1906 a Provedoria decidiu construir imóveis para alugar em seu enorme quarteirão de 78 mil metros quadrados. Começou com oito casas na avenida Independência, concluídas em 1907. Nos anos seguintes foram construídos prédios ao longo da mesma avenida e depois na rua Sarmento Leite e na avenida Osvaldo Aranha, até a praça Argentina. Além de abrigarem dezenas de famílias, neles funcionavam uma livraria, um brechó, um armazém, pequenas lojas e o ateliê dos fotógrafos Léo Guerreiro e Sioma Breitman, imigrante ucraniano falecido em 1980 que se notabilizou por fotos de personalidades como Getúlio Vargas, Procópio Ferreira, Erico Verissimo e Villa Lobos.
A partir da década de 70, as casas foram abandonadas ou demolidas por falta de recursos para mantê-las em condições de serem ocupadas.
Em outubro de 2007 a Provedoria iniciou um projeto de restauração de alguns dos prédios da avenida Independência que escaparam da demolição para a instalação de um Centro Histórico-Cultural. O coquetel de lançamento, ao ar livre, junto às obras, foi um emocionado encontro de antigos moradores, seus familiares e descendentes. Entre os mais conhecidos, compareceram o folclorista Paixão Cortes e a ex-deputada Dercy Furtado. Cartazes colocados em painéis, intitulados "Morar...nas Casas da Santa Casa", expunham trechos dos depoimentos sobre o privilégio de terem vivido nelas.


Na foto aérea de 1949 cedida pela Provedoria da Santa Casa podem ser vistos os prédios do complexo hospitalar e as casas da avenida Independência (à direita) e da rua Sarmento Leite (abaixo), até a esquina da avenida Osvaldo Aranha.


O complexo hospitalar da Santa Casa em 2010:
As obras do Centro Histórico-Cultural, na av. Independência, assinaladas pela seta amarela no alto da foto.

Na rua Sarmento Leite todas as casas foram demolidas para dar lugar ao Hospital Santa Rita, o Hospital da Criança Santo Antônio e a Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas, antiga Faculdade Católica de Medicina.

A seta amarela de baixo assinala o local onde antes havia o casarão, na esquina da rua Sarmento Leite com a avenida Osvaldo Aranha.

Clique sobre as fotos para ampliá-las

O Centro Histórico-Cultural tem um site para interessados e pesquisadores:

http://www.centrohistoricosantacasa.com.br/

A CASA DA VÓ DILINA


A foto abaixo, de 1977, é do arquivo do Correio do Povo e foi cedida pelo seu autor, o repórter fotográfico José Ernesto.

Por quase trinta anos, o casarão da esquina da rua Sarmento Leite com a avenida Osvaldo Aranha foi arrendado à viúva Adelina Verissimo Orsini até o seu falecimento, em 1966. O prédio, demolido no final da década de 70, até hoje vive na memória afetiva de seus netos, que lá passaram momentos felizes na infância.


Laís Lobato Heberle no coquetel de lançamento do Centro Histórico-Cultural da Santa Casa de Misericórdia (outubro de 2007)

Passar as tardes com a avó materna Adelina, carinhosamente chamada de vó Dilina, e as tias-avós Ana (Nica) e Ernestina (Titina), que também moravam no prédio, era um dos passeios prediletos da neta Laís, de seus irmãos e primos. Na casa da avó sempre tinha um licor de butiá preparado por ela para oferecer às visitas, algumas delas vindas de Rio Grande, sua cidade natal. De vez em quando aparecia o tio Sady Orsini, advogado, que aproveitava as pausas entre uma audiência e outra para conversar com a mãe, a irmã Suely e as tias Nica e Titina.

Em longo depoimento que deu à Equipe de Pesquisa Histórica da Santa Casa, Laís fez uma viagem sentimental ao tempo em que o casarão, com seus quartos e corredores enormes, reinava majestoso naquela esquina estratégica do centro de Porto Alegre. A seguir, um pequeno trecho:

"A minha avó Adelina Verissimo Orsini morava numa casa da Santa Casa, na rua Sarmento Leite 289, esquina com a Osvaldo Aranha, defronte à Faculdade de Engenharia. No lugar onde era a casa da minha vó hoje é a Faculdade de Medicina e um estacionamento(...). Ela continuou morando lá até 1966, quando faleceu. Aí a casa foi entregue à Santa Casa. Eu ia muito à casa da vó. Casa, não. Na verdade era um quarto, mas era uma casa para a gente. Ela vivia muito bem naquele quarto. Ela tinha um Alvará da Santa Casa que permitia locar outros quartos. Este Alvará ficava na parede do quarto dela. Geralmente ela alugava para estudantes universitários. Tinha uma sacada e era muito organizada, super caprichosa, os guardanapos bordados. Era tudo muito bonito, muito organizado. A gente sempre escutava os sinos da igreja da Conceição.
Aí então era a hora de ligar o rádio da minha tia-avó Nica e escutar a Ave-Maria. Ouvíamos os sinos nesses pátios aqui. Era onde se escondiam os ninhos de Páscoa e a gente tinha que procurá-los. Eram três pátios internos, e o térreo dava para a calçada. A gente era proibida de chegar naquele portão e sair para a calçada; só podia brincar naqueles pátios. Tinha goiabeira... era a maior alegria. Os bondes passavam ali. Lembro que minha vó descia, pegava o bonde na esquina e ia ao Mercado. Tinha na esquina a padaria dos portugueses".


Outros depoimentos:

"Morar nas casas da Santa Casa, na avenida Independência, era a glória. Para mim era um sonho alguém estar ali naquelas casas".
(Dercy Furtado)
"As casas da Independência eram altas. Era assim: tocava a campainha, a gente puxava uma cordinha para não se descer a escada. "
(Cecy Piva)

"Ninguém queria sair das casas porque era um ponto excelente, compreende? E não eram casas caras, e eram muito grandes, dava para muita gente morar."
(Paixão Cortes)

Leia também o post As Casas da Santa Casa, neste blog:
https://clovisheberle.blogspot.com.br/2010/11/as-casas-da-santa-casa_13.html




quinta-feira, 4 de novembro de 2010

DITADURA DA MODA


Para os homens, tudo é muito simples. Além de não terem que se submeter a torturas medievais como depilações e cortes de cutículas, passam ao largo da cruel ditadura da moda: cueca samba-canção ou sunga? Sapato preto de bico fino ou sapatênis? Jeans tradicional ou calça cargo? Tem tudo para todos os gostos e preços. Se o shortão comprado no verão passado ainda está inteiro, por que comprar outro?
Já as mulheres, tadinhas das mulheres!
Queiram ou não, gostem ou não, acabam se dobrando ao que determinam os estilistas. Pior: algumas das "tendências" atravessam os anos. As calças jeans com cintura pouco acima do púbis, por exemplo, encurtam as pernas e alongam o tronco, passando um visual estranho. São bonitas em adolescentes magrinhas, longilíneas, mas expoem ao ridículo todas as demais mulheres - as que têm cintura, uma barriguinha, quadris e aquelas curvas tão apreciadas pelos homens. Para muitas, o jeito é - como dizem os repórteres de tevê - andar de legging com um camisetão por cima e tênis. Horrívelmente feio.
Nesta estação, a "tendência" são os enormes óculos de sol tipo JO, usados por Jaqueline Kennedy/Onassis nos anos 60. Eles ficam bem em mulheres altas, de rostos grandes, angulosos, uma minoria no Brasil de morenas com estatura mediana e rostos finos. Baixas, magras, adolescentes ou maduras, todas as que usam os JO ficam parecidas, com lentes imensas tapando o rosto. Nas vitrines e até nas bancas de camelôs é inútil procurar um modelo adequado ao tipo físico de cada uma.
As bolsas femininas são cada vez maiores e pesadas, certamente para desestabilizar qualquer tentativa de caminhar elegantemente e, quem sabe, atrair olhares masculinos. Menos mal que a moda dos sapatos de sola pata de elefante, em que as coitadas mal conseguem se equilibrar, está passando.
Mesmo sem ser chegado em teorias conspiratórias, arrisco um palpite: nas últimas décadas está havendo uma articulação mundial para enfeiar as mulheres, deixá-las deselegantes, desglamurizadas, masculinizadas - Nelson Rodrigues já falava nisso em suas crônicas, no final dos anos 60. É só olhar os desfiles de moda: as modelos - sempre magérrimas, tristes - vestem modelitos grotescos, non sense, apreciados apenas por quem não gosta de mulher.
Gurias, vou dar uma sugestão: rebelem-se!
Não sejam vítimas da moda. Rejeitem roupas ou adereços que não favoreçam o tipo físico de vocês. Procurem até achar o que fique bonito, ou simplesmente não comprem.
Os homens agradecerão, e aplaudirão de pé.