sábado, 15 de agosto de 2020

FUMAR ERA UM HÁBITO

 


Até a década de 1980, chegar na casa de alguém, sentar e acender um cigarro era tão normal que havia cinzeiros junto às poltronas. Fumar era permitido nos ônibus interurbanos e nos aviões, que tinham cinzeiros acoplados junto aos bancos. Restaurantes e ambientes de trabalho ficavam cobertos por nuvens de fumaça. Campanhas anti-tabagistas tinham poucos resultados diante da publicidade das indústrias de cigarros, que associavam o ato de fumar a charme (havia uma marca chamada Charm), elegância, virilidade (nos homens) e personalidade e sucesso (nas mulheres, principalmente). Foi só depois de um acidente com um avião da Varig perto do aeroporto de Orly, na França, que incendiou por causa de uma bituca de cigarro, em julho de 1973, que as autoridades passaram a se preocupar com as consequências do tabagismo. Fumar nos banheiros dos aviões - onde começou o incêndio em que morreram 123 pessoas - foi proibido, e mais tarde criaram-se as alas de fumantes, como se a fumaça não fosse compartilhada por todos os passageiros e tripulantes.

Com o passar dos anos, aumentou a pressão contra o fumo em locais fechados. A publicidade de cigarros foi proibida, e as carteiras de cigarro passaram a exibir advertências sobre os malefícios do tabagismo. O que antes era um hábito virou um vício. Um vício caro para as pessoas e para o sistema de saúde dos países. 

O que era usual se tornou um desrespeito absurdo contra os não-fumantes. 

Os cinzeiros agora são objetos de decoração. 






terça-feira, 4 de agosto de 2020

CRESCER SEM DESTRUIR




ATHOS STERN

Engenheiro, 
professor aposentado da Escola de Engenharia da Ufrgs.
Presidente da Associação Comunitária de Imbé - Braço Morto.

 O  objetivo principal do crescimento é proporcionar aos habitantes uma melhoria na qualidade de vida e este é um processo que deve ser permanente. Planejamento é um processo, desta forma não deve ser confundido com o Plano. O Plano serve para guiar a ação por certo período e é resultado de um amplo processo de análises e acordos. Um Plano de Desenvolvimento Urbano deve prever o futuro e os possíveis impactos positivos e negativos, os quais, muitas vezes, favorecem ou contrariam os interesses econômicos de grupos, mas dificilmente atendem os anseios da população, e as prefeituras não preveem impactos negativos.
 O Estatuto da Cidade foi criado para nortear os Planos Diretores dos municípios que pretendem obter desenvolvimento e crescimento, sendo o objetivo principal ordenar o desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. As cidades são como são em virtude das normas e diretrizes estabelecidas nesses documentos, ou seja, tudo é moldado pelo Planejamento Urbano. Os Planos Diretores das prefeituras não atendem o Estatuto da Cidade por incapacidade técnica de sua equipe, preocupada com o adensamento populacional e aumento da arrecadação. Tanto o adensamento adequado quanto a criação de poli centralidades são princípios do desenvolvimento orientado ao transporte sustentável, uma estratégia de planejamento que articula o uso do solo à mobilidade urbana para criar cidades compactas, conectadas e coordenadas.
O Plano Diretor deve prever áreas de expansão, considerando a infraestrutura que será necessária para acompanhar esse crescimento, em especial a diretriz do próprio Estatuto da Cidade, que pressupõe a gestão democrática, com participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano. (A expansão pretendida pelas prefeituras é transformar áreas rurais e Áreas de Preservação Permanente em áreas urbanas).
 Conforme já apontado, cabe ao plano diretor criar as bases para uma cidade inclusiva, equilibrada, sustentável, que promova qualidade de vida a todos os seus cidadãos, reduzindo os riscos do crescimento desenfreado e distribuindo de forma justa os custos e benefícios da urbanização. Além disso, o plano diretor fornece transparência para a política de planejamento urbano, ao instituí-la em forma de lei. Diretrizes urbanas sempre existirão, a diferença é que com o plano diretor elas ficam explícitas, disponíveis ao cidadão para criticar, compreender e atuar sob “regras do jogo” bem definidas. Com ele, o cidadão pode decidir melhor ao escolher onde comprar uma casa para morar, o empresário pode escolher melhor onde investir em um novo negócio.  Por exemplo: uma família adquire um terreno e constrói sua residência. Se não houver um PD adequado, logo após é construído um prédio de 15 andares, ao seu lado, roubando-lhe tudo o que sonhou. Vejam a foto a seguir, que serviu de exemplo para a equipe da UFRGS mostrar as deficiências de um PD mal realizado:






O Plano Diretor deve prever a infraestrutura urbana composta de serviços e equipamentos urbanos como o saneamento básico, iluminação pública, melhoria dos serviços de transporte e outros. O saneamento básico no Brasil abarca uma gama ampla de serviços. Entram nesse escopo o Plano Integrado de Esgotamento Sanitário, Drenagem Urbana e Resíduo Sólido. A questão ambiental é muitas vezes esquecida e está relacionada à oferta de bons espaços públicos. Estabelecer zonas e corredores verdes na cidade é uma forma de criar uma rede de espaços públicos de temperatura mais amena e menores índices de poluição. Isso pode ser feito por meio de diretrizes específicas no PD, que versem sobre a quantidade e o dimensionamento de áreas verdes. (As prefeituras tendem a substituir gramados, vegetações nativas, etc. por áreas pavimentadas impermeáveis, canchas de skate, passeios pavimentados, canchas de esporte, etc.)
 As mudanças climáticas são uma realidade. Fenômenos extremos, como tempestades e furacões, devem se tornar cada vez mais frequentes e intensos. Tanto a prevenção quanto a capacidade e agilidade de resposta de uma cidade diante dessas ocorrências depende, antes de tudo, do saneamento básico que é um direito garantido por lei! (Como exemplo de ausência de prevenção, incapacidade e falta de soluções para os alagamentos que tem ocorrido nos municípios):



A drenagem da água da chuva para evitar enchentes é muito importante no saneamento básico, porque enchente não é culpa da chuva, é um problema da falta de planejamento e crescimento desordenado. A cidade precisa melhorar a infraestrutura de drenagem nas vias públicas. O grande problema é que em geral, os municípios não possuem um projeto de drenagem pluvial, decorrente da falta de recursos humanos preparados para realizar estes planos e para tomar decisões de médio e longo prazo. Se o Ministério Público for procurado, pois atua na defesa da ordem urbanística, do uso e ocupação do solo urbano, tendo por objetivo assegurar planejamento, organização e qualidade de vida sustentável das cidades, certamente nada poderia fazer, devido à ausência de técnicos competentes para solucionar o problema. Então cabe as perguntas: como solucionar o problema? O que pode e deve ser feito? Quem poderia ajudar? Quando fazer, agora, médio prazo ou longo prazo?

Além disso, a expansão significa mais congestionamentos, poluição e viagens mais longas. O ar poluído, impulsionado principalmente pelo uso de carros particulares e caminhões, gera imensos custos sociais, econômicos e impactos na saúde. Já estamos vendo algumas das áreas urbanas que mais crescem em zonas costeiras de baixa altitude, planícies de inundação, em locais de elevada biodiversidade e áreas com problemas de água. O desenvolvimento desenfreado desses ecossistemas sensíveis pode forçar ainda mais os recursos naturais e levar a inundações desastrosas. A Prefeitura Municipal de Xangri-lá contratou diagnóstico da UFRGS, que através de equipe técnica, levantou os principais problemas Ambientais e Urbanísticos do município. Entre outros, abordaram a Contaminação do Solo e Recursos Hídricos (mar, rios e arroios). Observa-se que muitos especialistas não dão a importância que exige os deságues que ocorrem em todo o nosso litoral, pois como as fotos mostram, estes deságues podem interditar a praia inteira.  Considerar como insignificantes estes córregos poluídos, face as dimensões do oceano,  é impróprio.



A maior dificuldade para implementação do Planejamento Integrado, decorre da limitada capacidade institucional dos municípios para enfrentar problemas tão complexos e interdisciplinares. A prefeitura de Xangri-lá diante deste fato, recorreu à UFRGS. Atitude elogiável! Somente como referência ao diagnóstico da UFRGS, este aborda o grande problema que ocorre nos municípios do litoral, com densificação elevada: o sombreamento!


A situação do município de Imbé pretendida pela prefeitura é infinitamente pior. Só para lembrar:




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Um modelo de desenvolvimento urbano excludente e predatório continuam presentes em várias dimensões do processo de urbanização no litoral norte do Rio Grande do Sul. Esta observação busca discutir alguns dos obstáculos que têm incidido sobre a capacidade da rede urbana brasileira de responder ao desafio de ampliar o direito à moradia e à cidade para o conjunto de moradores. O crescimento da economia, têm provocado um dos maiores ciclos de crescimento do setor imobiliário nas cidades litorâneas do Rio Grande do Sul e do Brasil, criando desafios que não são poucos, pois não se trata apenas expandir. A infraestrutura praticamente inexistente em algumas cidades, não poderão absorver este crescimento, pois a base financeira, política e de gestão, sobre a qual foi construído um processo de urbanização, consolidou um modelo.
 Os Planos Diretores (PDs) são instrumento básico da política de desenvolvimento de uma cidade. É a legislação que define as diretrizes para a gestão territorial e a expansão dos municípios. Planejamento urbano, designa o ato de planejar, organizar ações e tarefas com a utilização de métodos adequados para atingir determinado objetivo – nesse caso, o desenvolvimento sustentável das cidades. Regidos pelo Estatuto da Cidade, os Planos Diretores norteiam o desenvolvimento e o crescimento dos municípios – têm o objetivo de ordenar o desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. O Estatuto das Cidades indica o caminho para reverter o processo inadequado de ocupação do espaço urbano ao incorporar diretrizes para o uso e ocupação do solo, para a preservação e ocupação de áreas verdes, de forma a reduzir a impermeabilização das cidades, bem como ações de intervenção preventiva e de realocação de população das áreas de risco, regularização fundiária e medidas estruturais. Todos os municípios devem formular as suas políticas públicas visando à universalização, sendo os Planos de Saneamento Básico (PMSB) o instrumento de definição de estratégias e diretrizes para os municípios brasileiros. Os municípios tinham até dezembro de 2019 para confeccionar e implementar os planos sem risco de perder verba federal em obras no setor. “Diagnóstico da situação dos Planos Municipais de Saneamento Básico e da regularização dos serviços nas 100 maiores cidades brasileiras “, das 5.570 cidades brasileiras, apenas 1.693 (30%) realizaram seus Planos Municipais; 38% das cidades declararam que estão com os planos em andamento. Grande parte dos municípios do litoral norte não possuem estrutura e nem técnicos habilitados a realizarem o Plano Municipal de Saneamento Básico e, de que forma, pela falta de saneamento básico, lixo jogado e o uso intenso de agrotóxicos para a produção de alimentos, iremos impedir os resultados negativos às águas do nosso rio Tramandaí, em constante degradação?